segunda-feira, 22 de junho de 2009

Novo percurso

A chuva fina tornava os passos inseguros. A calçada já destruída, cheia de limo, fazia as pernas vacilarem na descida da rua lateralmente localizada ao hospital.
Estação Clínicas do metrô: atravessou o longo corredor que conduzia à saída da estação enquanto decidia se passaria no banco antes ou depois do expediente no trabalho. Decidiu mudar o percurso para o caminho que não tinha bancos. Apressou os passos, seguindo pela rua à esquerda e atrás do grande hospital das Clínicas. Pensou, ainda, em tomar a direita e adentrar o hospital, passar no médico e queixar-se da velha otite para ganhar um dia ou dois. Decidiu-se pelo caminho à esquerda e atrás do hospital.
Disputou um lugar na calçada cheia de enfermos e seguiu para o trabalho. Notou que os sapatos estavam bastante molhados - “malditos sapatos de pano!”. Desejou tirá-los e esticar as pernas na poltrona da sala.
Enfim, chegou à ruazinha mal movimentada. O vai e vem de funcionários, por um instante, confundiu-a: grandes manchas brancas que subiam a rua na sua direção. Despertou e conseguiu desvencilhar-se de um carro que, passando pela sarjeta, jogou água por todos os lados. "Filho da puta!" - pensou, carregando a censura da mãe por onde quer que fosse.
Descendo a rua, notou que o caminho era muito mais longo que o caminho habitualmente percorrido. Lembrou-se dos belos olhos azuis de Luis e da pele branca, dos dentes e do sorriso. E sorriu. Ao passar por uma grande curva, percebeu que estava bem atrás do hospital.
Foi surpreendida por um homem que, vestido de branco, apresentava-se como mais uma mancha branca no canto do olho direito. Seriam as pessoas, também os médicos, somente manchas, de várias cores? O homem passou e diminuiu os passos enquanto ela andava atrás dele.
Conseguiu ultrapassá-lo e saiu, subitamente, em frente a um bar, na movimentada Oscar Freire. Abandonara a calmaria daquela espécie de alameda próxima ao Instituto Médico Legal - onde provavelmente estariam alguns dos passageiros ainda não identificados daquele acidente aéreo - para reencontrar-se diante de tantos carros e de tanta gente que bebia no bar no meio da semana?
Atravessou a rua um pouco atordoada, desvencilhando-se novamente de um carro, que acabaria de molhar o sapato e também as roupas, e voltou para aquela espécie de alameda. Desse lado, porém, encontra outro tipo de calmaria: pequenas lojas com estilo convidativo e acolhedor se apresentam: uma sapataria, uma loja de roupas de fabricação própria, uma pequena loja de produtos naturais.
Sorriu novamente. Lembrar-se dele era especialmente agradável num dia como aquele. Ele era um homem cuja lembrança fazia suspirarem as mais incrédulas.
Parou diante de uma padaria numa esquina e pensou se compraria pães. Lembrou-se da dieta e desistiu da ideia. Pensou nos trabalhos que a aguardavam e sentiu-se triste.
Atravessou mais uma rua, dessa vez chegando já ao trabalho. Ao avistar o café decidiu entrar para comprar algo e, finalmente, decidiu que contaria tudo a ele.

Acordou no sofá, com as pernas esticadas na poltrona enquanto chovia fortemente lá fora e a rua à esquerda do hospital tinha mudado de lugar.

Um comentário:

Língua Solta disse...

Chinchilla! Muito bom!

Quem sabe se a gente pudesse dar voz às suas produções? Tipo um áudiobook! Dá trabalho, mas...
bjk.. Rodolfo